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9 de dezembro de 2020O Boi Caprichoso anunciou na noite deste sábado (5), durante o espetáculo ‘Ópera Amazônia: A Festa do Povo Caboclo’ a decisão de manter o tema “Terra: Nosso Corpo, Nosso Espírito” para a temporada 2021. Com a perspectiva positiva de que o próximo ano sinaliza um cenário favorável a realização do Festival Folclórico de Parintins, o bumbá reafirma o compromisso pela luta indígena, étnica, social, racial, ambiental e cabocla, causas que ultrapassam limites geográficos e se entrelaçam em um único território, o planeta Terra.
O anúncio ocorreu na abertura da festa com a apresentação de uma produção audiovisual (abaixo), a qual ilustra e ratifica o brado Caprichoso que não apenas se mantém, se fortalece ainda mais dentro do bumbá. Com a decisão, o Boi Negro de Parintins mantém o arcabouço do projeto, mas também discute agregar novos valores para a temporada, que só serão revelados em 2021.
Para o presidente do Conselho de Arte, Ericky Nakonome, o tema vai além da arena do Bumbódromo, e revela anseios que remetem à história do Caprichoso. “O canto para a Terra, para o território comum da humanidade é um brado tingido de azul e branco. O Boi Caprichoso eleva as vozes da resistência para pedir um novo tempo, uma era sem violações contra a mãe natureza. Entendemos que como caboclos/caboclas habitantes da Amazônia, temos o dever de lutar por isso, em todos os contextos e ocasiões”, frisou.
A conselheira de arte Larice Butel recorda os primeiros encontros para a efetivação do tema e do quanto a troca de saberes é crucial para o fortalecimento da luta. “Cada discussão demonstra se tratar de um objeto de estudo importante e atual. Fundamentar esse debate e mais do que isso, elevá-lo como bandeira em todos os nossos eventos, mostra que o Caprichoso é o Boi da luta popular”, destacou.
O bumbá apresentou ainda a nova identidade visual do tema 2021, a qual carrega os elementos já conhecidos pelo torcedor. É possível notar a mudança, necessária, na identificação do ano, o que sinaliza um novo tempo, com os mesmos propósitos.
Para a conselheira de arte, Socorrinha Carvalho, a sustentação temática é benéfica para o bumbá. “Já organizamos o caminho, temos um norte a seguir e agora contamos com o torcedor para embarcar conosco nessa luta”, expressou.
De acordo com o conselheiro de arte e diretor artístico Edwan Oliveira, o bumbá não poderia jamais deixar de lado um capítulo tão importante da história do festival. “A riqueza de possibilidades que temos com esse tema nos dá a confiança de que estamos no caminho certo. Cabe a nós a pesquisa, o debate e a luta, na certeza de que faremos o maior festival de todos”, comentou.
O presidente do Boi Caprichoso, Jender Lobato, enfatizou que a manutenção do tema reforça a unidade do bumbá. “Nosso grupo se mantém unido e cada vez mais forte, eu não tenho dúvidas de que tomamos a melhor decisão. Temos uma temática contundente, contemporânea, a qual se alinha com os esforços de diversos coletivos sociais espalhados pelo Brasil, pessoas que assim como nós acreditam em dias melhores. E sim, seremos campões do Festival de Parintins”, ressaltou.
“TERRA: NOSSO CORPO, NOSSO ESPÍRITO”
O ano de 2020 foi um ano difícil. Difícil para o folclore, para a cultura popular, para as artes. Difícil para o mundo. A pandemia do novo coronavírus provocou uma mudança de perspectiva, onde tivemos muitas perdas que hoje, gravitam em nossas lembranças, nossos corações e em nosso sentimento de gratidão.
Mas a arte sempre sobreviveu aos mais complexos obstáculos. Venceu dinastias despóticas, governos autoritários e repúblicas opressoras. A cultura popular insistiu e resistiu, como agora, onde sua poesia e canto ecoam pelas mais diferentes latitudes vencendo céus nublados e acinzentados.
A pandemia não deu sossego aos povos indígenas. Desde os atingidos pelo vírus, onde aldeias inteiras sucumbiram perante o mal, até a ação gananciosa de fazendeiros e agentes do agronegócio que, aproveitando-se da fragilidade dos índios, intensificaram suas investidas malsãs.
Por isso, vendo que os povos indígenas e comunidades tradicionais não tiveram um dia de paz diante do caos mundial, o Boi Bumbá Caprichoso decidiu manter o tema para 2021 em solidariedade e compromisso de luta, “marchando juntos outra vez”. “Terra: nosso corpo, nosso espírito” abraça a causa das mulheres indígenas que marcharam em 2019 em defesa de seu território, assim como muitas outras ao redor do mundo tornando este canto um libelo internacional.
Por isso mais uma vez reafirmamos nosso discurso e compromisso com as mulheres indígenas, cuja luta é também dos homens indígenas, da fauna amazônica, da flora brasileira e de todos os povos e comunidades tradicionais do mundo. O Boi Caprichoso abraça a causa de todos aqueles que lutam pela sua terra, por sua identidade, seu lugar de fala.
Em agosto de 2019, mulheres de mais de 130 povos de diferentes etnias reuniram-se em Brasília em torno da 1º Marcha das Mulheres Indígenas com o intuito de lutar contra as mais diversas formas de violação ao seu território, usurpado pela ação de gananciosos em busca de riqueza e poder. Com elas, mulheres de diversos países engrossaram o coro tornando o canto de resistência das mulheres guerreiras do Brasil num manifesto mundial.
“A terra está doente”, dizem elas, e junto à terra adoecem também a fauna, a flora, as tradições, os mitos, as cosmologias e os símbolos dos povos e comunidades tradicionais. A luta dessas mulheres é também a luta dos homens indígenas, é a luta do Davi Kopenawa, do Raoni, do Xicão Xukuru, Paulinho Guajajara e Nailton Pataxó; é a luta também da Maninha Xukuru, da Francisca, do Ajuricaba, do Maroaga e de tantos outrxs; é a luta de quilombolas, ribeirinhos, pescadores, de homens e mulheres do campo, das águas e das cidades. É a luta do folclore, da arte cabocla, da cultura parintinense, da tacacazeira, das benzedeiras e do sacaca. São fazeres e saberes que estão sendo ameaçados, vilipendiados, cerceados. Os povos estão vendo suas heranças serem interrompidas, aquilo que foi transmitido de pai para filho, de mãe para filha, tem se tornado cada vez mais um misto de cinza e pó. A luta pela terra, portanto, é a luta pelo lugar de fala e pertencimento dos povos indígenas e comunidades tradicionais da Amazônia e de todo o Brasil.
Mas o Boi Caprichoso não apenas adere ao manifesto como também amplia esta luta abraçando os povos de todas as nações que cada vez mais são movidos compulsoriamente por fluxos migratórios e apartados de suas próprias tradições por força da ação predatória do homem e de sua vaidade, loucos em suas verdades e sedentos em suas aspirações. Que terras mais estão sendo negadas àqueles que à ela pertencem?
Queremos com o tema “Terra: nosso corpo, nosso espírito” promover um grande “empate”- expressão cara à luta dos seringueiros – contra a destruição da terra, contra a extinção de seu bioma, contra as queimadas, contra o envenenamento dos rios, contra a pesca predatória, o roubo dos minerais, das águas, o assassinato de lideranças indígenas e o feminicídio nas aldeias.
Em “Terra: nosso corpo, nosso espírito” queremos promover um levante dos mitos e lendas da região, do folclore e da cultura popular, onde sua dramatização na arena se configure num plano de resistência, num “movimento de cura” da terra.
Uma dramaturgia rica onde em três noites serão apresentados estes movimentos de cura desta terra doente. E essa cura somente é possível através da resistência e da celebração de suas culturas. O Caprichoso não se exime da realidade e através da arte cabocla, azul, e encorajados pelo ímpeto e pela força de sua galera é que lançaremos um brado de resistência ao mundo.
É a luta por nossa identidade, uma identidade-Caprichoso, afinal, é lutando por aquilo que é nosso que mostramos aquilo que nós somos.